Vamos para mais uma cultura cervejeira nossa que deve ser revista?
Hoje, falarei sobre algo que escutamos desde cedo, principalmente nas propagandas de cerveja: “Cerveja tem que ser estupidamente gelada.”.
A primeira coisa que temos que saber é que a cerveja estupidamente gelada não é de jeito nenhum a temperatura ideal para as cervejas especiais. Pois, nossas papilas gustativas, quando extremamente resfriadas, sofrem uma espécie de anestesia, fazendo com que pouco se sinta os gostos e diferencie sensações no paladar. Então, quanto mais gelada, menos sentimos seu sabor. Ou seja, os valores negativos, não devem ser usados de jeito nenhum. Já que fazem perder todo sabor e até mesmo o aroma da cerveja.
Portanto, se você quer sentir melhor os sabores e aromas da cerveja que você vai tomar, é bom você ficar atento à temperatura dela.
Cada estilo de cerveja tem o resfriamento adequado para que suas características não sejam perdidas (veja aqui sobre estilos). Por isso, ao tomar uma cerveja com a sua temperatura ideal, você perceberá que seu sabor irá ficar mais realçado e você terá uma melhor experiência n ahora da degustação.
Alguns rótulos já vêm indicando a temperatura ideal para aquela cerveja. Portanto, tente respeitar essa indicação.
Então, aí vão algumas faixas de temperaturas e quais os estilos ideias:
2°C a 4°C – São consideradas temperaturas muito geladas, mas não extremas. Ideais para cervejas mais refrescantes como as Pilsner, Witbier, Helles, Kölsh e cervejas sem álcool.
5° C a 7°C – São consideradas bem geladas. Recomendadas para as cervejas mais alcoólicas e complexas, geralmente mais amargas ou com o ABV acima de 6%, como as IPA , Stout, Bock, Weiss e Tripel.
8°C a 12°C – São consideradas geladas. Ideais para as Lagers escuras, Pale Ale, Amber Ale.
12°C a 16°C – Consideradas “temperatura ambiente”. Ideias para cervejas do tipo Ale, mais alcoólicas e licorosa como as Russian Imperial Stout, a maioria das Belgas (incluindo as, Stong Ale, Trapistas, Quadrupel) e as Bocks mais fortes como Eisbock e a Doppelbock.
Em alguns casos, as cervejeiras/geladeiras não aumentam tanto a temperatura. Quando é assim, se a temperatura ideal for mais elevada, recomendo tirar da geladeira antes e esperar um pouco para que ela chegue na temperatura ideal, assim você possa servir. Te garanto que faz toda a diferença.
Agora, se a cerveja for essas industrializadas como Skol, Brhama, Original, Itaipava, pode tomar extremamente gelada, pois o intuito delas não é de proporcionar diferentes sensações, mas apenas refrescar.
Não é fácil controlar a temperatura exata da cerveja. Mas é bom saber que as menos alcoólicas são ideais mais geladas e as mais alcoólicas e complexas, menos geladas.
Em relação àqueles copos/canecas congelados, se for para beber cervejas especiais, fuja deles! Pois, além de tirar o sabor e aromas da cerveja, eles a deixa aguada. Na caneca congelada encontramos partículas de gelo que, em contato com o líquido, se transforma em água. Aí complica, né?!
Agora, se for para beber cerveja comum, manda brasa!
Algumas cervejas trazem em seus rótulos a medida SRM ou EBC. Eu digo algumas, pois essa indicação, assim como o IBU, não é obrigatória.
Mas o que é isso?
As duas siglas são escalas utilizadas para medir a cor da cerveja: a EBC, é a medida europeia, e a SRM, a medida americana.
A escala EBC (European Brewing Convention – Convenção de Cervejeiros da Europa), pode ser aplicada à cor da cerveja ou apenas à cor do malte.
O SRM (Standard Reference Method – Método de Referência Padrão), é uma escala usada nos Estados Unidos para determinar a coloração da cerveja.
Há uma terceira escala: a Degrees Lovibond (ºL) – a escala original – criada por Joseph Williams Lovibond, em 1983. Que equivale à SRM.
Para fazer a conversão de EBC em SRM, basta usar a fórmula SRM = EBC / 1,97. Alguns arredondam os valores.
Então, quando um rótulo traz essas siglas, está dizendo pra você a coloração da cerveja que está dentro daquela garrafa, já que a garrafa normalmente é marrom ou verde e não dá para ter uma noção exata da sua cor.
Os valores mais baixos correspondem a cores mais claras de cerveja e valores mais altos para cores mais escuras.
O que determina a cor da cerveja?
A cor está diretamente ligada à definição do tipo de cerveja. Se a cor não corresponde com o estilo, não foram usados os ingredientes corretos, mas não significa que a cerveja esteja ruim.
O principal responsável pela coloração da cerveja é o malte utilizado e o seu grau de torrefação.
O que é torrefação? No processo de produção do malte existe a etapa de secagem e torra do grão. Quanto mais torrado o malte é, mais escuro ele fica, e o malte em contato com a água depois de moído, passa todos os seus pigmentos para o líquido o “colorindo”.
Por exemplo, a cor de uma Stout é marrom escura pra preta, para chegar nessa cor são usados maltes mais torrados. Já a Pilsen, é mais clara, tem que ser feita com malte sem torrefação.
Existem outros fatores que alteram a coloração da cerveja como frutas e até mesmo corantes naturais (que são permitidos no Brasil para corrigir ou intensificar as cores de uma cerveja), como é o caso da Caracu, que é escura devido à adição de caramelo e xarope de açúcar. Eu falei sobre isso nesse post sobre Diferença entre Malzbier e Cerveja Especial Escura
New England Ale feita com Graviola e Pitaya da Cervejaria Eitanoiss
Como calcular o SRM da cerveja?
Para determinar o SRM de uma cerveja, pode ser usado um espectrofotômetro, que mede a absorção de luz a 430 nm através de um centímetro de cerveja. O aparelho exibe um resultado de acordo com a quantidade de luz que consegue atravessar a cubeta onde está o líquido. Então é atribuído à cerveja um grau SRM variando de 2 a 40+ no grau de intensidade de cor, sendo 2 as cervejas mais claras e 40+ as mais escuras. Porém, muitos medem no “olhometro”. Existe um cartão de referência visual para corresponder a cor da cerveja à determinada cor do cartão.
Para termos ideia do SRM de uma cerveja: Uma Standard American Lager (que são as mais comercializadas, tipo Skol) tem SRM 2 a 3. Já uma Sout (cerveja escura) tem entre 30 e 40+.
Cores dos principais estilos de cervejas:
Pilsen: amarelo palha límpido Witbier: dourado claro turvo IPA: do âmbar pálido ao cobre avermelhado Weiss: do amarelo palha ao dourado escuro turvo Red Ale: do âmbar ao cobre avermelhado Porter: marrom Stout: do marrom escuro ao preto
Veja a cartela de classificação SRM e EBC (com valores arredondados):
Agora, vamos aprender um pouco mais sobre a Escola Franco- Belga, em que a maioria chama apenas de Escola Belga.
Um pouco de história
Durante o Império Romano, na região conhecida como Gália, atualmente França e Bélgica, os habitantes da região já produziam sua própria cerveja, que já era bem diferente das cervejas mais consumidas pelos romanos.
As cervejas ainda eram produzidas domesticamente. E, com a queda do Império Romano e a ascensão da Igreja, começaram a surgir monastérios por todas as regiões. Estes monastérios foram construídos com cervejarias, que tinha como finalidade atender os próprios monges e também a população local. (A History of Beer and Brewing – Ian Spencer Hornsey).
Como aquela região não pertencia ao Império Germânico, seus cervejeiros já tinham o costume de inovar nas receitas e não eram obrigados a fazer uma cerveja que seguia a Lei da Pureza Alemã (onde só podia ter água, malte, levedura e lúpulo). Com isso, ao longo dos anos os monges aprimoraram suas técnicas e faziam cervejas rebuscadas, complexas em questão de aroma, sabor e teor alcoólico. As cervejas podiam ser feitas com cereais, frutas, mel, e outros temperos. A criatividade podia ser usada.
A tradição cervejeira naquela região surgiu quando os monges produziam cervejas para dar de beber aos viajantes, pois a água era imprópria para consumo, o que tornava o processo de fabricação da cerveja perfeito para garantir a qualidade da bebida. Também por ser uma bebida altamente nutritiva, era considerada a bebida dos monges. Nos tempos em que eles tinham que fazer jejum, as cervejas mais encorpadas eram fundamentais e serviam como alimentação deles.
Abadia x Trapista
Rochefort (Abbaye Notre Dame de Saint-Remy in Rochefort)
As cervejas trapistas são cervejas feitas de acordo com as premissas religiosas dos monges beneditinos da Ordem Cisterciense da Estrita Observância, uma congregação católica que obedece à Regra de São Bento – mais conhecida como Ordem Trapista. Em resumo, essa ordem pregava (e ainda prega) uma vida voltada à obediência, ao silêncio e à renúncia, tendo como lema ora et labora (“reza e trabalha”).
Durante a metade do século XX, as cervejas produzidas pelos monges trapistas começaram a inspirar outros produtores mundo afora. Ao replicar as receitas dos trapistas, esses outros produtores passaram a usar o termo “cerveja estilo trapista” ou “tipo trapista” nos rótulos, mesmo sem nenhum vínculo com a Ordem.
Para que isso não ocorrese mais, em 1962, uma lei da Câmara Belga do Comércio decretou que cerveja trapista seria somente aquela que é produzida por monges cistercienses, e não uma cerveja no estilo trapista. Estas últimas deveriam ser denominadas “Cerveja de Abadia”.
Sendo assim, podemos dizer que:
Trapista não é um estilo, e sim uma denominação controlada de origem.
Para ser considerada Trapista, a cerveja precisa ser fabricada em um dos mosteiros da Ordem Trapista, seguindo estritamente determinados preceitos como: a cerveja deve ser fabricada dentro das paredes do mosteiro trapista pelos próprios monges ou sob a sua supervisão; a cervejaria deve ser subordinada ao mosteiro e deve ter uma cultura empresarial condizente ao projeto de vida monástica; a cervejaria é quase filantrópica, sem fins lucrativos. Os recursos são para o sustento dos monges e para a preservação da abadia. O dinheiro que sobra é usado para causas sociais ou doado para pessoas carentes. A cerveja trapista é de uma qualidade impecável, que é controlada permanentemente. Há um selo de denominação de origem, para fins de identificação.
Cervejas que não são fabricadas nos mosteiros da Ordem Trapista, mas seguem os métodos de fabricação similares e acompanham a linha de estilos considerados, são denominadas Cervejas de Abadia. Podem inclusive conter tal designação no rótulo.
Toda cerveja Trapista é de Abadia, mas nem toda cerveja de Abadia é Trapista.
Existem mais de 170 mosteiros trapistas no mundo, porém, apenas 11 deles têm o certificado da autêntica cerveja trapista e podem chamar sua cerveja de Trapista.
Uma curiosidade é que a La Trappe, umas das mais tradicionais cerveja Trapistas é conhecida tanto por ser da Escola Belga, que muitos acham que ela fica na Bélgica. Mas, ela fica na Holanda!
Os onze monastérios estão assim distribuídos:
seis na Bélgica: Rochefort (Namur), Achel, Orval, Westmalle, Vleteren Oester (Westvleteren, Chimay; sendo as principais cervejas Dubbel, Tripel, Quadrupel, Belgian Ale,
dois na Holanda – Abadia de Koningshoeven – cerveja La Trappe, Abdij Maria Toevlucht (em Klein-Zundert)
uma na Áustria – Engelszell
uma na Itália – Abadia das Três Fontes (Roma)
uma na Inglaterra – Mount St Bernard Abbey (Tynt Meadow)
uma nos Estados Unidos – St. Joseph’s Abbey (Spencer- Massachusetts) – Única fora da Europa.
Bélgica: Uma história a parte
Estão inclusos os seguintes países na Escola Franco-Belga: Bélgica, Norte da França e Holanda.
Mesmo em um território tão pequeno, a Bélgica se destaca dentre os três países, reconhecida como o “paraíso cervejeiro”. Talvez, por isso, denominem apenas como Escola Belga. São mais de mil cervejarias espalhadas por todo o país – muitas delas com centenas de anos de existência. Por lá, a cerveja é tão levada a sério que, a maioria das cervejarias só servem as cervejas no copo da própria cervejaria da qual você pediu. Por exemplo, se você pedir uma cerveja da Orval, se não tiver o copo da Orval disponível naquele momento, eles não te servem a cerveja. Você tem que escolher outra cerveja que tiver com o copo disponível. Para eles, cerveja é uma tradição, tanto que a Unesco declarou a cultura cervejeira belga como Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade.
Uma cervejaria belga famosa é a Delirium, famosa cerveja do elefantinho cor de rosa. O bar da cervejaria, o Delirium Café, que fica em Bruxelas, conta com uma carta com mais de dois mil rótulos de cervejas. Por isso, ele foi parar no “Guinness Book of Records” como o bar com mais cervejas do mundo.
CARACTERÍSTICAS DA ESCOLA FRANCO-BELGA
O destaque dessa escola é a criatividade. Produzem estilos diferentes de cervejas especiais, como as fermentadas em barris de carvalho, as feitas com várias especiarias frutas, sementes, flores e leveduras selvagens. Além disso, existe, ainda cervejas feitas pelo método de champenoise e até algumas parecidas com vinho.
O maior segredo das belgas é a levedura, que são responsáveis pelos distintos sabores e aromas das cervejas.
Características principais: O adocicado é o que mais se destaca nas cervejas dessa escola. Elas costumam ser mais encorpadas, super aromáticas, têm sabores complexos e com toque de frutas ou especiarias. Geralmente, são mais maltadas e alcoólicas. Devem ser tomadas devagar para a percepção do sofisticado e complexo sabores.
Devido à essa complexidade, na maioria das vezes, eu não consigo tomar aos montes dessas cervejas. Mas, eu adoro!
Então, se você é desses, que gosta de experimentar o diferente, gosta de diversificar, de descobrir novas sensações, aposte nas cervejas que seguem essa ecola.
Exemplo de alguns estilos de cervejas dessa escola:
Belgian Blonde Ale: São mais claras e menos amargas, complexas, perfumadas e muito cremosas. Há uma grande harmonia entre seu teor alcoólico, sua presença de lúpulo e de malte.
Belgian Dark Strong Ale: As cervejas desse estilo são mais maltadas, mais escuras e menos frutadas, porém com um aroma complexo, com notas de malte e frutas como a ameixa, figo ou uva-passa. São cervejas de espuma densa e persistente.
Belgian Dubbel: Seu nome foi dado em função dela ser bem mais forte que as tradicionais Ale consumidas nos mosteiros da época. A presença do malte é marcante, com toques de nozes e chocolate em seu sabor, de pouco amargor e com a cor variando do cobre ao marrom. Seu aroma tem notas de frutas não-cítricas, como a banana.
Belgian Trippel: Se comparadas às Belgian Dubbel, as Belgian Tripel são ainda mais fortes, embora mais claras e mais amargas, ainda que mais frutadas. Geralmente são cítricas, com notas de cravo e baunilha.
Belgian Quadruppel: Pertencem ao estilo Belgian Specialty Ale, portanto não podem ser consideradas um estilo de cerveja, apesar de aparecerem nesta descrição por terem se tornado bastante populares. São muito maltadas, bastante alcoólicas, atingem em média 10% de teor alcoólico, a presença do lúpulo é pouco notada.
Belgian Witbier: É a de trigo deles. Um pouco diferente das cervejas de trigo alemãs, já que geralmente usam trigo não maltado em sua receita, que também é adicionada de algumas especiarias como coentro e pimenta da Jamaica, casca de laranja. São bem claras e turvas, por não serem filtradas. São cervejas muito refrescantes por serem cítricas. Eu adoro essa! Ótima pedida em dias quentes.
Belgian Lambic: São produzidas através da fermentação espontânea que consiste em expor a própria cerveja a leveduras selvagens e consequentemente a bactérias. Estas cervejas apresentam componentes com um forte carácter ácido.
Dica Mineira de cervejas que seguem a Escola Franco-Belga:
Belgian Blond Ale: Frei Galdi da Cervejaria Fürst Belgian Pale Ale: Belgian da Cervejaria Athos Belgian Dubbel e Quadrupel: Cervejaria Wäls Belgian Tripel: Inocência da Krugbier Witbier: Toekan da Abadia das Gerais Bière de Garde: Saint Hilaire da Uaimií
A história indica que a cerveja já era produzida nas ilhas Britânicas em 55 a.C., quando o general romano Júlio César, comandou a primeira invasão à Inglaterra. Na ocasião, avistou povos da tribo que consumiam uma bebida alcoólica fermentada, feita a partir de grãos (a cerveja da época).
A Escola Britânica é a que mais se transformou entre as três escolas cervejeiras clássicas. Teve uma determinada época, que se consumia a hidromel (obtido da fermentação do mel). Em seguida, houve uma evolução para a fermentação também do malte de cevada, produzindo uma bebida forte, doce e alcoólica. O lúpulo começou a ser usado por volta do século XV.
Com a introdução do lúpulo para ser usado como conservante, os ingleses passaram a gostar do amargor, assim, mudaram completamente o conceito de suas Ales. De doces passaram a ser cada vez mais amargas. Naquela época, passou-se a chamar as lupuladas de Beer e as menos amargas de Ale.
As primeiras menções históricas à cerveja Porter remontam ao início do século XVIII na Inglaterra. Existem algumas teorias divergentes sobre a sua origem, porém o fato é que estas cervejas mais escuras e de perfil torrado faziam sucesso entre os clientes dos pubs e, mais notoriamente, entre os trabalhadores que transportavam cargas nos mercados locais e nos portos, chamados popularmente de Porters.
Outro momento marcante (meados do século XX), foi quando grandes cervejarias apareceram com suas Lagers em massa, desaparecendo com as cervejas fortes. No final da década de 70, consumidores revoltados com o desaparecimento do jeito inglês de fazer cerveja, criaram o CAMRA (Campanha pela Cerveja de Verdade – Campaign for Real Ale): responsável pelo resgate de estilos e da cultura dos pubs e dos pequenos cervejeiros.
Hoje, mesmo as Lagers sendo as mais consumidas, os ingleses continuam fiéis às Ales.
As cervejas da Escola Britânica são basicamente formadas por cervejas Ales (alta fermentação).
Mais uma curiosidade: Um dos hábitos ingleses é consumir cervejas em barris (chope), com isso, mais de 75% das cervejas são vendidas nas torneiras dos pubs ingleses.
Estão inclusas nessa escola os seguintes países: Inglaterra, Irlanda do Norte e a Escócia
CARACTERÍSTICAS DA ESCOLA BRITÂNICA
Então, como vimos, a Escola Britânica possui fases distintas refletindo assim em seus estilos. Algumas têm características doces e alcoólicas, outras são leves e amargas e outras são fortes e amargas. Têm para todos os gostos!
Suas cervejas têm características variadas, mas, em geral, o destaque fica por conta da doçura dos maltes que, junto com os lúpulos ingleses, trazem características herbais e terrosas, e equilibram as cervejas. A maioria é de cor escura.
Eu gosto muito dessa escola, principalmente quando o destaque é para o maltado. E para quem já me conhece, meu estilo de cerveja favorito é a Porter/Stout!
—————————————————————————- Alguns estilos da Escola Cervejeira Britânica:
ENGLISH PALE ALE- Ale de cor âmbar, frutada, caracterizada por um grau alcoólico baixo (abaixo dos 4%) e com um amargo intenso, devido à grande quantidade de lúpulos ingleses. Existem outras duas variações: Best Bitter – que indica uma cerveja do mesmo tipo mas com uma gradação alcoólica com cerca de 4,5%, e a Extra Special Bitter (ESB) chegando até os 5,5%.
INDIA PALE ALE – surgiu da necessidade de transportar cerveja da Inglaterra à Índia, que no século XVIII era colônia britânica. Como ainda não existiam tecnologias modernas de refrigeração, e para que os ingleses que serviam na Índia não ficassem sem opção de cerveja, os cervejeiros britânicos buscaram uma solução: passaram a aumentar a quantidade de lúpulos em suas produções. Este aumento, aliado ao teor alcoólico mais elevado e menos açúcar residual, atuavam como conservantes nas cervejas, assim conseguiam transportá-la. As IPA’s inglesas são amargas, bem maltadas e encorpadas, com cor variando do âmbar-dourado ao cobre-claro.
BROWN ALE – O amargor e as características do malte estão nitidamente presentes tanto no aroma quanto no sabor. Sua cor pode variar entre o âmbar escuro e o marrom. Tem nuances de caramelo e castanha.
PORTER – De coloração marrom-escuro, com aromas e sabores predominantemente maltados, remetendo ao toffee, chocolate e torrefação. Tem um médio amargor.
STOUT – Antigamente esse nome Stout indicava a cerveja mais alcóolica da gama do produtor. Destaque pelo uso de grãos torrados, o que aumenta a amargura e reforça o sabor do café. Existem vários tipos de Stout: Oatmeal Stouts, produzidas com aveia; as Sweet Stouts, produzidas com aditivos como açúcar, lactose e/ou chocolate; e as Russian Imperial Stouts, mais intensas em corpo, amargor e teor alcoólico; Chocolate/Coffe Stout são Stout adocicadas com doces e chocolates; e Dry Stout, ou Irish Stout, que tem perfil intenso de torrefação, baixo corpo e paladar seco, representado pela famosa Guinness. Existem versões mais alcoólicas chamadas Extra Stout.
OLD ALE – Cor escura, corpo cheio e grau alcoólico elevado, aromas de frutas vermelhas secas. Na garrafa pode envelhecer.
BARLEY WINE – O “Vinho de Cevada” é uma cerveja complexa, caracterizada por uma alta gradação alcoólica, gosto maltado, frutado e geralmente lembra o vinho. Geralmente de cor âmbar-escuro.
SCOTCH ALES – Têm característica maltadas e adocicadas. São as cervejas escocesas de maior teor alcoólico, com sabor muito maltado e caramelado, de pouco amargor.
Dica de Cerveja Mineira com estilo Britânico:
– English Pale Ale: God Save the Queen da Cervejaria Küd;
– Burton Pale Ale da Cervejaria Seu Tomé;
– Stout da Corja Brew;
– IPA: Melon Collie da Capapreta.
Antes de falar sobre a Escola Alemã, vamos um pouquinho de história.
Até o século VIII, a produção de cerveja era uma tarefa doméstica de responsabilidade das mulheres. Depois de algum tempo, a responsabilidade foi passada para monges e freiras em monastérios e, com o aumento da demanda, os artesãos passaram a produzi-la também.
Com o crescimento da produção e a escassez de alguns ingredientes primordiais para a população, os governantes alemães decidiram por padronizar a produção da cerveja e proibir o uso de alguns desses ingredientes. Daí, surge a tal “Lei da pureza alemã – Reinheitsgebot 1516”. Com a criação da lei, a bebida somente seria denominada bier (cerveja em alemão) se fosse produzida apenas com três ingredientes: água, malte e lúpulo. Na época, a levedura não tinha sido descoberta. Essa lei está em vigor até hoje na Alemanha.
O país, é um dos maiores produtores e consumidores de cerveja do mundo, devido a sua posição geográfica e pelo seu clima ideal para cultivo de cevada e lúpulo.
CARACTERÍSTICAS DA ESCOLA ALEMÃ/GERMÂNICA
A Escola Alemã, ou Germânica, é considerada a mais tradicional das existentes. É bem clássica, pois foca nos ingredientes básicos da cerveja. Água, malte, lúpulo e levedura. A maioria de suas cervejas é Lager (baixa fermentação), apesar também de ter as Ale (alta fermentação), como as Weiss (de trigo). Que, na minha opinião, são as melhores cervejas de trigo que já tomei.
Fazem parte da Escola a Alemã os seguintes países: Alemanha, República Tcheca e Áustria.
Características principais: Há um equilíbrio entre os ingredientes. Você não sente nenhum ingrediente se destacando demais, como o doce do malte ou o amargor do lúpulo. Não se admite a adição de frutas ou especiarias, como existe nas cervejas belgas; e as leveduras utilizadas nas cervejas germânicas são de caráter límpido, sem deixar muitos resíduos aromáticos.
Então, se você é desses, que não curte cervejas muito amargas e com aromas e sabores fortes, aposte nas tradicionais cervejas que seguem a escola alemã.
Principais cervejarias da Alemanha encontradas por aqui no Brasil.
Aí vai a dica de alguns estilos de cervejas dessa escola, que eu amo!
As três primeiras são as que você mais encontra nas cervejarias alemãs. Quando estive por lá, percebi que a maioria das cervejarias que serve a própria cerveja, servem apenas esses três estilos.
MUNICH HELLES – a cerveja clara, refrescante e leve. em uma relação direta com a Pilsner e é normal que sejam feitas comparações. A Munich Helles é uma Lager que apresenta coloração entre amarela e dourada, ela é mais maltada que as Pilsners e também é mais encorpada. Seus aromas devem ser de grãos e panificação e apresentar um leve amargor do lúpulo que equilibra com o dulçor do malte.
DUNKEL – São versões escuras de alguns tipos de cervejas claras alemãs, produzidas através de maltes tostados. São bem leves e saborosas.
WEIZEN OU WEISS – São as típicas de cervejas de trigo. Graduação alcoólica moderada com o amargor leve ou inexistente. Aroma frutado, geralmente de banana e temperos como o cravo. Existem também as Weizenbock ou Weizendunkel, com uma coloração mais escura e graduação alcoólica elevada.
PILSEN: São douradas, translúcidas, leves, duradouras e possuem uma espuma cremosa. Possuem sabor seco, com o lúpulo suave e o amargor considerado baixo ou médio. O equilíbrio pode mudar de levemente maltosa até levemente amarga, porém é muito próxima do centro.
MARZEN e OKTOBERFESTBIER – A principal cerveja da Oktoberfest na Alemanha. As suas características é uma cor dourado levemente escuro, corpo cheio e redondo, com toques de biscoito e malte. Com o teor alcoólico um pouco mais elevado.
BOCK – Cerveja escura, pouco amarga, gradação alcoólica de 6,5%- 7%.
VIENNA – Coloração avermelhada, nuances de biscoito e frutas vermelhas, álcool baixo e médio amargor.
KÖLSCH – Produzida com leveduras selecionadas. Cor dourada, geralmente com um amargor leve e aromas florais do lúpulo.
E você, curte essa escola? Eu adoro todos esses estilos!
Alguns exemplos de cervejas mineiras com estilos da Escola Alemã:
Para quem está começando a entrar no mundo cervejeiro é importante saber que existem Escolas Cervejeiras. Depois que você entender cada uma delas, conseguirá distinguir mais facilmente os estilos e até mesmo qual escola cada estilo segue.
Alguns países foram pioneiros na criação de determinados estilos de cerveja e se tornaram referência para o mundo. Eles criaram estilos de cervejas com características e personalidades próprias, ditaram regras, desenvolveram técnicas de produção, processos e fórmulas para que os principais e mais conhecidos tipos de cervejas fossem criados e apreciados até hoje.
Devido a todos esses fatores, esses países passaram a ser considerados como escolas para o resto do mundo, compondo assim as Escolas Cervejeiras.
Resumindo, podemos dizer que baseada em tradição e inovação, a escola cervejeira representa a história e a cultura da produção de cervejas desses países.
Historicamente, são consideradas grandes escolas cervejeiras a Escola Alemã ou Germânica, que inclui também a República Tcheca, Eslováquia, Áustria e Polônia; a Escola Britânica ou Escola Inglesa, que inclui a Inglaterra, Escócia e Irlanda; e a Belga, que engloba Holanda e parte da França. Cada uma desenvolveu sua forma de fazer cerveja e criou seus próprios estilos. Essas três são escolas milenares.
Agora, falando em algo mais recente, nos anos 70, surgiu a Escola Americana. Muitos torcem o nariz e dizem que não é uma escola, pois eles não criaram estilos totalmente novos. Eles apenas adaptaram os estilos já existentes e deram a “cara deles”. Mas, outros dizem que, sim, eles são considerados escola já que usaram como base os estilos já existentes e potencializaram a suas fórmulas, dando uma característica, uma personalidade, peculiar daquele país. Portanto, a Escola Americana, passou a ser incluída na seleta lista de Escolas Cervejeiras.
Ainda têm países que estão procurando se estabelecer e ser reconhecido como escola, que é o caso do Brasil. Alguns defendem que o Brasil deveria ser considerado uma escola pela criatividade e inovação das cervejarias brasileiras. A adição de frutas e outros ingredientes inusitados são nossos principais destaque, mas, ainda não somos considerados uma Escola. Seguimos na luta.
Nos próximos artigos, falarei sobre cada Escola e suas características.
Já falamos da água, do malte e, agora, é a vez dele: O Lúpulo. Ingrediente muito amado por muitos, pois ele é o responsável por conferir o amargor e o aroma (o perfume – floral, cítrico, picante…) de muitas cervejas.
O lúpulo é uma planta trepadeira que pertence à família das Canabidácea e gênero cannabis. Seu nome científico é Humulus Lupulus.
Seu uso varia de acordo com a cerveja fabricada. Ou seja, a quantidade de lúpulos que é inserida, o tipo de lúpulo usado e quando ele é colocado durante a fabricação, determina qual será o produto final.
Lúpulos no Brasil
Por muitos anos, achava-se impossível ter plantação de lúpulo aqui no Brasil, devido a nossa posição geográfica. Por isso, o lúpulo era totalmente importado, a maioria dos EUA e Alemanha, países onde o verão são mais longo que no Brasil. Com isso, o lúpulo aproveita esse longo período para florescer antes do inverno chegar (eles precisam de luz). No Brasil, não se tem tantas horas de luz solar durante o desenvolvimento do lúpulo, o que o impede de crescer.
Porém, devido a novas técnicas e diferentes soluções, já é possível cultivar a planta no Brasil.
Para se ter uma ideia, nos EUA e Alemanha é possível obter 800g de cone seco por planta em uma safra. A média no Brasil, hoje, é de 200g/planta. Porém a Fazenda de Fartura (uma das pioneiras) já conseguiu 500g/planta durante uma safra (dados Aprolúpulos). Já existem fazendas que fornecem lúpulos 100% nacional, como a Brava Terra.
A longo prazo, espero que com os lúpulos nacionais sendo fornecido em maior escala, ajude a diminuir os preços das cervejas.
São vários os tipos de lúpulos, vindo de países diferentes como Reino Unido, Estados Unidos, Alemanha, Austrália, e com características diferentes para diferentes estilos de cerveja, como os com pouco aroma, aroma cítrico, aroma herbal, muito amargo, menos amargo, etc. Por isso, é preciso saber as característica de cada um para saber qual colocar em cada estilo de cerveja para que ela não saia do estilo determinado.
Funções do lúpulo
Além da função de dar aroma e amargor à cerveja, o lúpulo tem outras atribuições. A principal dela é servir como um conservante natural da cerveja. Ele possui algumas substâncias que inibem a proliferação de bactérias na cerveja. Com isso, ajuda a prolongar a vida da cerveja nas prateleiras, antes de ir para a geladeira. Além disso, o lúpulo é rico em substâncias antioxidantes, que atuam contra radicais livres. Como as cervejas especiais não usam produtos químicos, como já falei anteriormente, a planta é de suma importância para a cerveja e sua conservação.
Foi por isso que um estilo particular de cerveja surgiu, a India Pale Ale, famosa IPA. Contam historiadores que, na virada do século XVIII, um cervejeiro britânico teria produzido uma Pale Ale mais forte e aumentado sua carga de lúpulos para preservar a bebida durante a viagem de vários meses para a Índia. O lúpulo garantia que, durante toda a viagem, a bebida chegaria sem contaminação do líquido. No final da viagem, a cerveja acabava adquirindo grande intensidade de aroma e sabor de lúpulo. Perfeito para satisfazer a sede do pessoal britânico nos trópicos e se mantinha conservada.
E não para por aí, a estabilidade da espuma da cerveja depende de vários fatores e um deles é a presença dos compostos amargos do lúpulo.
Quando eles são inseridos durante a produção?
Dry Hopping
Existem vários momentos para a adição do lúpulo. Isso vai depender de que tipo de cerveja você vai querer. Pode ser colocado antes da fervura, durante ou depois. Como este é um assunto técnico, não vou entrar em detalhes.
Obs: Em algumas cervejas vemos a seguinte descrição: Dry Hopping, que é o processo onde há a adição de lúpulo na cerveja durante o período de fermentação, ou seja, na fase fria do processo, para adicionar aroma de lúpulo fresco ao produto final. Essa técnica deixa a cerveja super aromática! Quando bem feito, ao abrir a cerveja, sente aquela explosão de aromas lupulados. HUuMm.
Curiosidades
– A evidência mais aceita do primeiro campo de cultivo de lúpulo data de 736, no jardim de um prisioneiro de origem eslava, próximo a Gensenfeld, no distrito de Hallertau, região da atual Alemanha. Seu uso é bem antigo;
– O lúpulo foi introduzido nas cervejas da Inglaterra no início do século XVI, e, no caso dos Estados Unidos, tendo o cultivo começado em 1629, no estado de Virginia Ocidental onde, hoje, é o Distrito de Columbia e a cidade de Washington;
– Hoje, existem mais de 200 opções de lúpulo. Dentre as diversas possibilidades, podemos destacar notas florais, cítricas, herbais, frutadas, resinosas e picantes.
– Enquanto o malte dá uma característica doce à cerveja o lúpulo fornece um contraponto amargo à esse doce. Ou seja, ele é usado também para dar equilíbrio à cerveja. Enquanto o malte adoça, vem o lúpulo com seu amargor não permitindo que a cerveja fique enjoativa, doce;
– Nas cervejas comerciais, o lúpulo aparece quase que só para quebrar o doce maltado. Eles existem nelas, mas colocam tão pouco que são imperceptíveis;
Pellets
– Para a produção cervejeira, o lúpulo é vendido tanto ao natural (em flores) quanto na forma de pellets (mais comum);
– O IBU: é a abreviatura para International Bitterness Unit. Em português, podemos chamar de algo como unidade internacional de amargor. É pelo número de IBU que podemos ter uma ideia de o quão amarga é uma cerveja. Quanto maior o número indicado, mais amarga é a cerveja;
– O lúpulo leva normalmente 3 anos para atingir a sua maturidade em campo;
– Você sabia que o lúpulo faz bem para saúde? Ele auxilia desde os problemas com insônia a tratamento de dermatite. Confira esses dois link sobre os benefícios do lúpulo para a saúde: Link 1Link 2 ;
– Lúpulo em inglês é hop e em alemão é hopfen;
– Pode ser fatal para cães e gatos: O contato não é comum, mas, para quem produz cerveja em casa, vale a pena informar. O lúpulo jamais deve ser ingerido por seu cão ou gato, pois é altamente tóxico para eles, provocando ataque epilético, problemas no coração e pode até causar a morte.
Você sabia que falar de gosto não é a mesma coisa que falar de sabor?
O quê???
Sim. Gosto é diferente de sabor.
Eu falo isso porque a gente vê algumas resenhas e opiniões sobre cervejas falando de gosto ou sabor sem distinção, como se fossem a mesma coisa (eu mesma fazia isso e ainda tenho dificuldade em falar o correto na hora certa).
Então vamos lá!
Gostos existem apenas cinco: doce, salgado, azedo, amargo e umami (difundido na cozinha oriental, encontrado também no tomate), que podem ser identificados pelo sentido do paladar, ou seja, a responsável por senti-lo é a língua. Gosto é exatamente aquilo que sentimos quando a bebida/comida entra na boca.
Já o sabor é uma mistura de sensações mais complexa, pois envolve mais de um sentido. Para sentir o sabor é necessária a combinação do gosto (paladar) com o aroma (olfato) de um alimento. O sabor já começa quando sentimos o cheiro. 80% do sabor depende do seu nariz. Por isso, quando você está gripado, não consegue saborear nada com prazer.
Alguns especialistas ainda completam dizendo que, além do aroma e do gosto, faz parte do sabor, também, a sensação, que seria o tato. A textura pode modificar a forma de sentirmos o sabor.
Portanto, o sabor é a interpretação que nosso cérebro faz de todas essas sensações ao mesmo tempo.
Exemplos de sabores da cerveja: Frutado (frutas vermelhas, frutas escuras, frutas tropicais), Caramelo, Chocolate, Toffe, Pão, Mel, Ervas, Limão, Capim e por aí vai…
Para fazer um teste simples para entender as diferenças entre sabor e gosto, especialistas indicam fazer o seguinte:
– Pegue uma bala de hortelã / Tampe o nariz / Coloque a bala na boca e permaneça com o nariz tampado.
Quando a bala é colocada na boca com o nariz tampado, é possível sentir apenas o gosto doce.
– Após alguns segundos destampe o nariz
Quando o nariz é destampado, além do gosto doce, é possível sentir o sabor da bala, neste caso de hortelã, através da interação entre o paladar e o olfato.
Então é isso, minha gente.
Gosto é gosto, sabor é sabor, aroma é aroma, textura é textura.
Não vai esquecer disso da próxima vez que for falar sobre alguma cerveja que esteja tomando, hein?!
Se você acompanha alguns cervejeiros de plantão, com certeza já deve ter ouvido a expressão off-flavor.
Mas o que é isso?
O Off-Flavor nada mais é que o defeito na cerveja.
Trata-se de um sabor ou aroma da cerveja que torna a experiência sensorial – paladar ou olfato – desagradável. Essa falha pode acontecer por alguns motivos como: falta de equilíbrio entre os 4 ingredientes básicos da cerveja (a água, lúpulo, malte e a levedura) durante a fabricação da bebida; falta de higienização; armazenamento inadequado; ou devido ao transporte. Com isso, o produto final pode conter um leve off-flavor, que pode ser aceitável em determinados estilos, ou pode conter um off-flavor inaceitável.
Alguns são mesmo necessários em certas cervejas e alguns são realmente características de estilos específicos.
Eles se tornam um problema quando presentes em altas concentrações e quando inadequados para o estilo da cerveja.
Roda de aromas / off-flavors
Lembrando que, além da expressão off-flavor (defeitos), existe também a On-flavor, que são os aromas e sabores desejados.
Cada pessoa tem um sentido mais aguçado que o outro. Por isso, nem todos sentem o mesmo defeito. Para detectar um off-flavor pode ser fácil, se estiver muito evidente. Porém, tem alguns que não são fáceis de serem detectados. Algumas pessoas fazem cursos de análise sensorial e off-flavor, onde aprendem a detectar esses defeitos e estudam suas causas.
Existem vários tipos de off-flavor, citarei alguns aqui:
Acetaldeído: Traz um sabor de maçãs verdes ou abóboras frescas;
Ácido Acético – Esse defeito pode estar no aroma ou no sabor, que lembra um vinagre;
Alcoólico: Quando um gosto alcoólico prejudica o sabor de uma cerveja. O sabor pode ser leve e agradável ou quente e incômodo;
DMS – Dimetilsulfureto ou DMS é percebido tanto no aroma quanto no sabor, lembra bastante o cheiro de milho ou vegetais cozidos;
Diacetil – Percebido no aroma e no sabor como manteiga, em casos mais extremos produz uma sensação oleosa no paladar. Nem todas as pessoas conseguem sentir o Diacetil. O cheiro de um saco de pipoca de microondas de sabor de manteiga ainda não estourado é um bom exemplo;
Metálico – Mais fácil de perceber no paladar do que no aroma, remete ao gosto de sangue, com um amargor adstringente e indesejado;
Oxidado ou Papelão – Aroma e sabor de papel molhado, também percebido quando a cerveja está “choca”;
Acetato de isoamila – o famoso aroma de Banana, comum em cervejas muito alcoólicas. Aceitáveis na maioria das Weissbier;
Sabão – Sabores de sabão são causados por não lavar/enxaguar muito bem o recipiente, mas eles também podem ser produzidos a partir das condições de fermentação;
Lightstruck ou aroma de gambá: Esse defeito é sentido em cervejas que usam garrafas verdes e transparentes. Essa coloração do vidro faz com que o líquido fique mais exposta à luz solar. O liquido fica “contaminado pela luz”. Por isso, a Heineken tem aquele sabor e aroma diferente. É um defeito. Porém, um defeito bem aceito. Veja aqui sobre diferença das cores das garrafas.
Adstringente – Dá uma sensação de boca seca, é a sensação de comer uma banana verde que “amarra” a boca. Pessoas que produzem mais saliva sentem menos essa característica;
A gente sempre escuta muitas informações sobre a cerveja artesanal e fica na dúvida se é verdade ou se é mito.
Vamos desvendá-los?
– A cerveja tem uma Deusa da mitologia: Verdade
Ninkasi é o nome da Deusa da Cerveja da Mitologia Suméria. Diz-se que ela fornece ao mundo o segredo para fazer cerveja. Na cultura sumeriana, ela também é conhecida por seu poder para satisfazer o desejo humano e saciar o coração. Além disso, ela é a Deusa do álcool e responsável pela “água espumante”. Ninkasi produzia a própria cerveja e a consumia diariamente. Esta história é de 10.000 a.C.
– A validade da cerveja artesanal normalmente é maior que a indicada no rótulo: Verdade
As obrigações sanitárias no Brasil não permitem uma flexibilização em relação às validades nas cervejas artesanais. Depende muito do tipo de cerveja, da concentração de malte e da graduação alcoólica. Normalmente uma cerveja artesanal dura mais do que sua validade e mesmo assim a deterioração é gradativa e não de um dia para o outro. Porém, algumas ficam melhores depois da validade, outras, piores. Tudo depende do estilo, da forma como foi produzida e como foi armazenada.
– Não existe copo específico para tomar cerveja: Mito
Para que os diferentes sabores e aromas da cerveja sejam ressaltados, cada estilo de cerveja pede um tipo de copo adequado. A Pilsen, por exemplo, pode ser apreciada em uma tulipa, por ter um formato fino em sua base e mais largo na boca, mantém a espuma constante e faz com que o aroma do lúpulo seja melhor sentido. Já a Weissbier, cerveja de trigo, será melhor apreciada em um copo Weizen. Esse tipo de copo é alto, possibilitando colocar todo o líquido da garrafa, incluindo o resto de levedura que fica depositada no fundo. Veja o post sobre “Tipos de copos”.
– A espuma tem uma função específica na cerveja: Verdade
A espuma protege a bebida da oxidação, ou seja, impede que ela entre em contato direto com o oxigênio e oxide. Além disso, ela mantém o sabor, o amargor que está presente na cerveja e mantém a temperatura da bebida no copo. O ideal são dois dedos de espuma. Portanto, sem essa de pedir ou servir cerveja sem colarinho! Veja este post sobre “A espuma e sua importância para a cerveja”.
– Cerveja artesanal é sempre amarga: Mito
Existem centenas de estilos de cerveja artesanal, alguns com o amargor quase que imperceptível outros com o amargor muito alto. Algumas são bem adocicadas, outras bem equilibradas que não sente nem o amargor e nem o dulçor em destaque. Então, não é verdade que todas as cervejas artesanais são amargas. Veja esta página que fiz dedicada somente aos estilos.
– O Lúpulo (ingrediente natural que dá o amargor à cerveja) é um poderoso conservante natural: Verdade
A função do lúpulo vai muito além de conferir o amargor e aroma característicos de uma cerveja. Além dessas características dele que já sabemos, ele também tem a função de conservante natural da bebida, ajudando a prolongar a vida de prateleira da cerveja. Além disso, ele pode ser utilizado na culinária e na cosmetologia para clarear a pele e prevenir manchas e inflamações do tecido dérmico. Veja este post sobre “O lúpulo na cerveja”.
– Cerveja engorda: Mito
A cerveja tem menos calorias do que a maioria das bebidas alcoólicas. Por exemplo, a cachaça, a vodca e o vinho são bem mais calóricos que a cerveja, pois, a caloria está presente no álcool. Portanto, quanto menor o teor alcoólico, menos caloria a bebida vai ter. O que engorda é beber de forma exagerada e optar por petiscos mais gordurosos. Se quer manter a dieta, beba com moderação e opte pelas cervejas menos alcoólicas.
– Existe diferença entre armazenar cerveja em lata ou garrafa translúcida, verde ou marrom: Verdade
O recipiente em que a bebida é guardada e a cor dele interfere no sabor, no aroma e na durabilidade de uma cerveja. Por exemplo, quanto mais clara for uma garrafa (garrafa transparente), maior é a exposição do líquido aos raios solares. Com isso, maior será o impacto negativo nos aromas e sabores da cerveja e menor será sua durabilidade. Na garrafa marrom, esse impacto é menor. Porém, o recipiente ideal para armazenar a cerveja é a lata. Nela não entra raio solar nenhum, isso faz com que o líquido se mantenha intacto. Por isso, algumas vezes, é possível sentir diferença em uma mesma cerveja na lata ou na garrafa. Veja o post sobre “O recipiente pode influenciar no aroma e sabor da cerveja”.
– Cerveja e saúde não combinam: Mito
Os ingredientes que compõe a cerveja (água, malte e lúpulo) são todos naturais e cada um traz um benefício para saúde. Se o consumo da bebida for moderado e responsável, é possível obter os benefícios do consumo da cerveja. Um exemplo são os polifenóis, compostos orgânicos presentes na cerveja, que desempenham importante função antioxidante no organismo. Veja esse post que falo sobre “Os benefícios da cerveja para a saúde”.
– Ingredientes naturais da cerveja têm potencialidades que merecem ser exploradas: Verdade
Os ingredientes naturais da cerveja fazem bem à saúde dentro e fora da garrafa. A cevada, por exemplo, é considerada pelos especialistas como um ‘superalimento’, ou seja, um alimento bastante completo, nutricionalmente muito rico e que pode ser ‘coringa’ em qualquer dieta balanceada. O grão pode ser consumido em substituição ao arroz, à farinha de trigo e na preparação de saladas, risotos e até chá.
– Há diferença nos ingredientes do chope e da cerveja de garrafa: Mito
Os insumos utilizados na fabricação do chope e da cerveja são os mesmos. Portanto, não há diferença. Por exemplo, o chope Pilsen de uma marca X, que está dentro do barril, tem os mesmos ingredientes da cerveja Pilsen dessa mesma marca que está na garrafa. O que difere é que temos o costume de chamar de chope o líquido colocado dentro do barril que não passou pelo processo de pasteurização. Por ele não ser pasteurizado, acaba ficando mais fresco, com sabores e aromas mais presentes e com um prazo de validade menor. Além disso, a forma como o chope é retirado das torneiras fazem com que ele receba oxigênio tornando-o mais cremoso. Leia o post Chope x Cerveja
– A cerveja deve ser sempre servida muito gelada: Mito
Cervejas muito geladas tendem a diminuir a percepção do sabor e da complexidade das cervejas. Isso significa que, ao beber a cerveja trincando, como costumamos falar, poderá perder parte da experiência que determinadas cervejas podem proporcionar. Cada estilo de cerveja tem uma temperatura ideal para ser servida.
Em caso de dúvida há uma regra básica que pode seguir: quanto mais escura, menos fria. Não é uma regra perfeita e para a qual existem muitas exceções, mas há boas possibilidades de acertar se a seguir. As cervejas mais escuras muitas vezes são mais complexas e a temperatura a menos fria realça esses sabores. As mais claras, especialmente as de menor grau alcoólico, tendem a ser menos complexas e mais refrescantes, por isso poderão ser tomadas em temperaturas mais baixas. Mas, como já disse, em se tratando de cerveja, não é uma regra. Veja este post sobre “Como armazenar a cerveja artesanal“.
Falando em cervejas escuras, elas têm bastante mitos e verdades. Vai aí um bloco inteiro sobre elas:
– Toda cerveja escura é muito alcoólica: Mito
O responsável pela cor da cerveja é o malte. No processo de malteação, os cereais são germinados e o procedimento é interrompido no momento ideal por diferentes maneiras de secagem, como tosta, torrefação e defumagem. De acordo com esse processo as cervejas ganham cores e sabores diferentes. Portanto, a cor da cerveja não tem ligação com seu teor alcoólico. Um exemplo é a Dry Stout, que é uma cerveja bem escura, porém com o teor alcoólico entre 4% e 5%. Veja este post sobre “Como é colocado o álcool na cerveja“.
– Cerveja escura é sempre doce: Mito
A coloração escura de uma cerveja definitivamente não é um indicador de dulçor. A Guinness, cerveja escura mais famosa do mundo, não é nada doce. Existem, sim, cervejas escuras doces, mas não é uma regra. Mas, sim, é a maioria.
Cervejas escuras são muito encorpadas: Mito
Mais uma vez, a cor da cerveja nada tem a ver com corpo. Existem cervejas claras encorpadas, escuras leves, claras leves e escuras encorpadas.
O corpo não é definido pela cor do malte, mas sim pela quantidade. A grosso modo, quanto mais malte for utilizado em sua receita, mais a cerveja será encorpada. Veja aqui o post “O malte e sua múltipla função“.
– Cervejas escuras não podem ser refrescantes: Mito
Apesar da maioria das cervejas escuras serem menos refrescantes, existem sim relevantes exceções. Exemplo são as Schwazbier e as American Brown Ale são bem refrescantes!
Acho que com esses mitos desvendados e as verdades confirmadas deu para aprender um pouco mais sobre a cerveja artesanal, né?!
Aproveite esses links que coloquei em cada tópica para aprender mais ainda.